peter2O princípio da isonomia ou, simplesmente, da igualdade, nunca esteve tão em voga quanto agora. Acusado pelo presidente do Flu, Peter Siemsen, de dar tratamento diferente aos clubes, no que diz respeito à negociação de dívidas, o procurador-regional, Agostinho Netto, negou as críticas. Ele ainda explicou toda a situação envolvendo a exclusão do Tricolor da Timemania, bem como as penhoras envolvendo bilheterias e recentes negociações de atleta, rebatendo o que foi dito pelo mandatário.

Confira a entrevista na íntegra:

 
 
 

Por que Fluminense e Botafogo foram excluídos da Timemania? E por que o Fluminense foi o primeiro – apesar de outros estarem atrasados há mais tempo?
AGOSTINHO NETTO – Até o final do ano passado, não foram feitas quaisquer exclusões com fundamento em eventuais inadimplências. A razão é que inexistia ferramenta de informática no sistema de controle do parcelamento (Timemania), àquela altura ainda em desenvolvimento. Ainda assim, mesmo que houvesse uma exclusão, não seria possível o prosseguimento da cobrança judicial dos débitos por absoluta ausência de liquidez desses. Após esse momento, com a ferramenta de informática do sistema de controle do parcelamento (Timemania) disponível, em várias oportunidades, durante as incontáveis reuniões realizadas com representantes dos quatro grandes clubes do Rio de Janeiro, todos foram alertados para o fato de que acaso não havendo a regularização dos eventuais atrasos (no Timemania), aqueles que assim permanecessem (em atraso) em número igual ou superior a três parcelas, seriam imediatamente, nos termos da lei de regência, excluídos. Isso efetivou-se com dois clubes, ambos excluídos na mesma data.

Mas outros clubes cariocas – o Flamengo especialmente – ficaram períodos maiores sem recolher a parcela. Por que não foram excluídos?
Vários optantes pelo parcelamento ficaram inadimplentes até o final do ano passado, considerando não apenas os clubes do Rio de Janeiro, mas também dos demais Estados. Ainda assim, pelas razões também já expostas, não houve qualquer exclusão. Repise-se, por absoluta ausência de ferramenta de informática disponível para tanto. De se sublinhar que aqueles cujo parcelamento (Timemania) permanece hoje ativo estão em dia com os pagamentos das suas parcelas ou, ao menos, com atraso inferior ao mínimo estabelecido em lei, isto é, até duas parcelas. A partir daí há fundamento para a rescisão do parcelamento.

 

De janeiro de 2011 até dezembro de 2012, a atual diretoria do Fluminense recolheu os tributos correntes em dia. Isso não foi levado em consideração na hora de excluir o clube?
A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional tem como missão a de recuperar créditos fiscais não adimplidos na esfera administrativa. A questão refere-se à busca da efetividade da cobrança dos créditos que não foram pagos e, por consequência, inscritos na Dívida Ativa da União. Portanto, todas as considerações avaliaram a situação do contribuinte diante do seu passivo fiscal inscrito em Dívida Ativa, não o passivo fiscal anterior à inscrição em Dívida Ativa da União. Fez-se uma avaliação da situação, porém diante daquilo que não foi pago na esfera administrativa de cobrança. De todo modo, repise-se que o clube devedor deixou de recolher parcelas correntes do Timemania.

O Flamengo praticamente não recolheu tributos devidos até dezembro de 2012. Qual a razão de ter sido escolhido para fazer o acordo? Houve diferença de tratamento?
Nenhum clube foi “escolhido”, tampouco recebeu tratamento diferenciado, para melhor ou para pior. Não houve diferença de tratamento. Estamos impedidos, constitucionalmente e por lei, de fazer qualquer exame jurídico que não seja orientado pela impessoalidade e pela isonomia. As condições a serem verificadas relativamente a todos foram e são da mesma ordem. Ponto de muito relevo é o de que alguns clubes devedores, ainda no momento em que se discutiam eventuais equacionamentos, tentaram superar as suas questões, judicializando-as. O Poder Judiciário decidiu integral, favorável e sistematicamente à Fazenda Nacional.

Mas procede a informação de que o Ministério Público Federal abriu procedimento para investigar a eventual falta de isonomia neste caso?
Não é verdade que haja qualquer procedimento aberto pelo Ministério Público Federal para investigar este caso ou qualquer outra atuação da Procuradoria-Regional da Fazenda Nacional na 2ª Região (RJ/ES), não havendo, portanto, qualquer registro formal em tal sentido.

 

O Flamengo não está pagando mensalmente apenas o valor referente a esse débito. Há que ser considerar todos os demais parcelamentos e mais tudo aquilo que foi pago à vista”
Agostinho Netto

É verdade que o Fluminense procurou a Procuradoria para apresentar toda a sua receita, levando cópias dos principais contratos? Por que o acordo não saiu?
Todos os clubes nos procuraram após penhora de créditos decorrentes dos contratos de cessão de direitos de transmissão de televisão aberta e fechada. Tais contratos, portanto, não foram trazidos graciosamente à Fazenda Nacional. Foram sim juntados aos autos das execuções fiscais, mas por determinação judicial em atendimento a pedido fazendário. As condições oferecidas pelo Fluminense não se mostravam aproveitáveis, dentre outras razões, por ausência de garantias efetivas. Quanto aos demais contratos, os próprios representantes do Fluminense informaram que os créditos não seriam suficientes. O clube, ainda, recusou-se a apresentar os contratos firmados com a dada e importante empresa, limitando-se a informar que a referida empresa não era mera patrocinadora do clube, figurando sob outra condição. Ponto importante é que os recebíveis oriundos dos referidos contratos de cessão de direitos de transmissão de televisão aberta e fechada já haviam sido, ainda que parcialmente, negociados ou antecipados. Em petição apresentada em execução fiscal que tramita em segredo de justiça, o clube se comprometeu a apresentar a garantia de uma das empresas com a qual mantém contrato, o que acabou não acontecendo nos termos propostos. Toda a avaliação feita pela Fazenda Nacional foi, como dado perceber, estritamente técnica, valendo sempre lembrar que muitas das situações examinadas já encontravam-se rigorosamente superadas por força de decisões judiciais constritivas (penhoras) em favor da Fazenda Nacional.

O Flamengo tinha R$ 30 milhões em penhoras que foram convertidos em pagamento para início do acordo. Boa parte dessa quantia era de Imposto de Renda na fonte e contribuição previdenciária retida – ou seja, apropriação indébita. Apesar disso, o acordo com o Flamengo saiu com muita rapidez. A dívida parcelada do Flamengo ficou – depois do acordo – em 54 milhões. A dívida total do Fluminense é aproximadamente metade disso. Por que a procuradoria não aceitou parcelar essa dívida em condições semelhantes?
Permita-se uma correção. O Flamengo quitou débitos para acabar com as penhoras existentes com dinheiro novo, sem prejuízo da conversão em pagamento do montante que já havia sido depositado judicialmente até aquela data. É importante restar esclarecido que não houve aproveitamento de valores antes depositados judicialmente, tendo havido novo e integral recolhimento pelo Flamengo, ainda em janeiro, quitando os processos nos quais havia determinação prévia de penhora. A maior parte da dívida de todos os clubes é, de fato, proveniente do não recolhimento do Imposto de Renda Retido na Fonte e da contribuição previdenciária incidente sobre a folha de salários. Esse valor informado de R$ 54 milhões, sobre o qual fala-se já que inscrito em Dívida Ativa da União (observo que na respectiva execução fiscal não foi decretado o segredo de justiça), sem risco, portanto, de ferimento a sigilo fiscal, foi o que restou após os pagamentos e parcelamentos realizados pelo clube. Tais débitos ainda estavam em fase de cobrança administrativa perante a Receita Federal do Brasil e só foram encaminhados para inscrição e ajuizamento a pedido, sublinhe-se, do próprio clube e, assim, permitindo-se o oferecimento de novas e integrais garantias. Isso foi feito. A comparação correta não é a que está sendo alardeada. O Flamengo não está pagando mensalmente apenas o valor referente a esse débito. Há que ser considerar todos os demais parcelamentos e mais tudo aquilo que foi pago à vista. Detalhes maiores, porém, sob pena, aí sim de ofensa a sigilo fiscal, devem ser demandados diretamente desse Clube.

O senhor revelou que recebeu ameaças de torcedores. Além disso, houve comentários de que pizzas e remédios foram enviados anonimamente para o gabinete da procuradoria. É verdade?
As correspondências recebidas pela Procuradoria-Regional da Fazenda Nacional na 2ª Região são sempre de caráter oficial e voltam-se exclusivamente às suas atividades e competências legais. Não há qualquer registro de que correspondências com os conteúdos apontados tenham sido recepcionados nos protocolos ou instalações da Procuradoria-Regional da Fazenda Nacional na 2ª Região (RJ/ES), em sua sede ou em qualquer das suas Projeções.