Dando continuidade à série de entrevistas com os candidatos à presidência do Fluminense, do NETFLU, nesta quarta-feira, publica a conversação com Celso Barros, pediatra, ex-mandatário da Unimed, patrocinadora do clube de 1999 a 2014. A entrevista segue os mesmo moldes das anteriores com Cacá Cardoso, Pedro Abad e Pedro Trengrouse, que não é mais candidato. Todos responderam às mesmas 13 perguntas e não tiveram limite de tempo para responderem a cada questão.

Clique aqui e confira as entrevistas com Cacá Cardoso (Parte I e Parte II) e Pedro Abad (Parte I e Parte II). Ainda esta semana postaremos a de Mário Bittencourt.

 
 
 

1 – Quem é Celso Barros?

Um tricolor apaixonado.

2 – Quando e como começou a sua ligação com o Fluminense de maneira mais ampla, ultrapassando a questão das arquibancadas?

Em 1999, quando o time atravessou problemas sérios por falta de recursos para investimento no elenco. Naquele ano, eu iniciava o meu trabalho como presidente da UNIMED-RIO, ainda uma cooperativa de seguro saúde, em fase inicial de crescimento. A minha paixão pelo Fluminense me obrigou a encontrar um caminho para ajudar o time. Criamos um projeto de marketing esportivo e com base nele patrocinamos o time. No primeiro momento, jogo a jogo. Depois, de forma direta na formação do time e da equipe de futebol. O projeto deu o resultado esperado, para o Fluminense e para a patrocinadora. O mercado reconheceu a parceria como o melhor patrocínio nacional. A parceria durou 15 anos. Foi encerrada quando a crise econômica no Brasil atingiu os planos de saúde.

3 – Quando surgiu a ideia de ser candidato à presidência do Fluminense?

De certo modo, sempre tive vontade de ser presidente, mas eu não conseguiria presidir o clube e ao mesmo tempo a patrocinadora. Mas participei intensamente das campanhas que elegeram os presidentes David Fischel, Horcades e Peter. Hoje, aposentado, não estando mais à frente da UNIMED-RIO, senti vontade de dar continuidade ao projeto iniciado há 15 anos. Um projeto de preparação do Fluminense para ser competitivo como futebol moderno, gerenciado com competência profissional e como um produto altamente lucrativo. O Fluminense sólido terá espaço entre os melhores do mundo.

4 – Como avalia a gestão no futebol nos últimos seis anos?

O presidente Peter Siemsen chegou no final de 2010. O Fluminense conquistou o Campeonato Brasileiro. O presidente mexeu no departamento de futebol em 2011, quando saiu o Alcides Antunes. Com alguma demora, chegaram o Sandrão e o Abel. O Fluminense foi tetracampeão brasileiro em 2012 e campeão estadual.

Em 2013, a UNIMED-RIO precisou reduzir os investimentos em marketing por causa da crise que começava a atingir os planos de saúde. A redução cumpriu o que foi planejado com o departamento de futebol e com o presidente. Em dezembro de 2014, a parceria terminou. O Fluminense teve um pequeno período com outra empresa e está há muito tempo sem patrocínio. A ausência de um projeto de marketing consistente, como foi o desenvolvido pela UNIMED-RIO, desestimula o patrocínio. O Fluminense não conseguiu em seis anos ter um marketing eficiente.

Na gestão financeira, o presidente enfrentou muitos problemas. Em alguns momentos, chegou a atrasar salários e impostos. Enfrentou um grave problema com a Receita Federal e o clube quase parou. No futebol, o patrocínio aguentou bem o tranco. Até que, com o aparecimento do PROFUT, o presidente conseguiu realinhar o fluxo de caixa. Parece que a gestão caminha com um pouco mais de tranquilidade, principalmente porque as cotas de TV aumentaram bem. Praticamente, dobraram.

No futebol de base, a gestão fez bons investimentos e trabalhou com estratégia de mercado. Os jogadores criados pela base passaram a ser elemento importante no fluxo de caixa. Mas essa situação não poderá ir muito longe, para permitir que o Fluminense forme jogadores que vistam a camisa por muito tempo e alguns venham a ser até mesmo ídolos do clube.

No campo político, a gestão venceu alguns desafios. Criou o sócio-futebol para dar ao torcedor o direito de voto, a prerrogativa de eleger o presidente. No conglomerado do clube (social e olímpico), o futebol passou a jogar o peso político maior.

Outra vitória foram as negociações com a Globo. O presidente – muitos talvez esqueçam – enfrentou no início do mandato a questão delicada do Clube dos Treze e uniu os clubes do Rio para dar novo formato com contrato com a Globo.

O CT deve ser contabilizado também como ponto positivo da gestão, apesar de ter sido fruto do esforço quase isolado de um membro da diretoria.

O ponto fraco foi a gestão do futebol, que a partir de 2013 passou a viver crises permanentes, contratações complicadas e caríssimas, sem resultado em campo. Isso deve ter reflexos nas contas do clube nos próximos anos. Mas, há que se ressaltar, no caso do futebol profissional a criação da Primeira Liga, um esforço do presidente do Fluminense. Ainda não é possível avaliar se o resultado será positivo para o futebol nacional. Contudo, os primeiros sinais são de ter sido uma medida acertada.

5 – O Fluminense já revelou diversos atletas olímpicos de capacidade reconhecida. Entretanto, de uns anos pra cá, algumas modalidades olímpicas foram tiradas do clube, como o futebol feminino e o basquete. É tão complexo assim manter um clube grande, assim como o Tricolor, na vanguarda dos esportes olímpicos também?

É sim, complexo, porque os esportes olímpicos, ao contrário do futebol, não são um negócio de retorno financeiro. No Fluminense há modalidades demais e estruturas de menos. Essa situação faz com que as modalidades disputem entre si espaços internos e concorram com o clube social.  Tenho informação que o basquete permanece. A atual gestão prometeu algumas vezes reduzir o número de modalidades, mas, no fim, deu tratamento político à questão.

6 – Com a construção do CT, teme-se um abandono da sede social do clube que, para muitos sócios, precisa de reformas urgentes. O que pode ser feito para que o espaço seja mantido dentro daquilo que se espera para um clube da magnitude do Fluminense?

Para o futebol profissional, Laranjeiras é a história, que se deve consertar, manter e explorar para orgulho dos torcedores e conquista dos torcedores mirins. Para as demais atividades, Laranjeiras é um clube social rentável e sede dos esportes olímpicos. Sem a presença do futebol profissional é preciso criar um projeto de exploração comercial da marca. Li que um candidato a presidente defendeu a construção de um shopping no lugar do campo. Seria equivalente a derrubar o Museu Imperial de Petrópolis para ter uma feira no lugar.

7 – Pedro Antônio disse que nunca cobrou nenhuma taxa Selic ao Fluminense. Também ressaltou que o clube nunca pagou os juros acordados no contrato. Como essa relação entre o dirigente e o clube pode ser ainda mais otimizada na sua gestão?

Se você pensar bem a questão, verá que ela é uma decisão unilateral e pessoal. Todas as medidas que sejam favoráveis ao Fluminense serão acolhidas na minha gestão.

8 – É possível pensar em estádio próprio ou utilização das Laranjeiras para jogos de pequeno porte no Rio de Janeiro?

Seria ótimo ter um estádio em Laranjeiras, mas se tomarmos como base as exigências modernas para o funcionamento de um estádio e o impacto ambiental no bairro e adjacências, acredito impossível. Sobre ter um estádio próprio, o Fluminense merece um. Mas, antes de prometer fazer, é preciso saber se há condições para fazer. No presente momento, diante do que sei das contas do Fluminense e do que representará em acréscimo de custos operacionais o funcionamento pleno do CT, vejo pouquíssima possibilidade de se construir nos próximos anos. Essa coisa de prometer só pra vencer eleição já mostrou no que pode dar.

9 – Fala-se muito de Xerém como fundamental para o futuro do clube. Entretanto, entende-se que a última revelação top fora o lateral-esquerdo Marcelo, vendido ainda na década passada. A base do Fluminense é mesmo tão boa quanto o torcedor acredita que seja?

Tomara que sim. O profissional tem aproveitado os jogadores da base com bons resultados. Em média, 1/3 do elenco. O problema maior é que duram pouco, pela pressão do fluxo de caixa.

10 – O marketing talvez seja a área mais criticada dentro do Fluminense. Qual é a sua opinião sobre aquilo que foi feito nos últimos seis anos na pasta e o que pretende fazer para mudar ou complementar o trabalho desempenhado?

Não há marketing no Fluminense. Aqui e ali surgiram projetos pontuais, mas que não vingaram. E nisso está o maior problema do Fluminense e, sinceramente, da maioria dos clubes brasileiros. Futebol é marketing. Só é um bom negócio se o marketing funcionar. A UNIMED-RIO cresceu muito em patrimônio e negócios no campo do seguro saúde porque, ao lado de outras medidas importantes, funcionou muito bem o principal projeto de MKT da Cooperativa: o patrocínio de um time de futebol. Leiam o balancete do clube – o último. O Fluminense apresentou 140 milhões de reais de receita. 100 milhões oriundos de direitos federativos e econômicos e cotas de TV. De licenciamentos e franquias, 1 milhão, cento e quarenta e dois mil. No marketing não há trabalho a complementar. Há um trabalho a fazer.

11 – Qual é a sua opinião sobre contratos assinados, de atletas, funcionários ou acordos em geral (TV, patrocínio e etc), que extrapolem a gestão vigente?

É um erro analisar essa questão sob a ótica do tempo. Vejam agora. O presidente tem dois meses de mandato. A valer a lógica, nenhum contrato se assinará. A questão deve ser o interesse do Fluminense. E, para fugir do risco dos contratos feitos para atender ao capricho pessoal do presidente, se deve impor a transparência absoluta. Nenhum mal há em assinar um contrato para além do tempo do mandato, desde que ele seja do absoluto e exclusivo interesse do clube e de conhecimento pleno de todos. E percebam quanto o Estatuto é sábio: a fiscalização dos atos do presidente e da diretoria cabe ao Conselho Deliberativo, que tem uma parte eleita a cada triênio, mas tem outra vitalícia. Com fiscalização e transparência se preserva o interesse do Fluminense.

12 – Os grandes críticos da atual gestão têm o futebol como o calcanhar de Aquiles do Peter Siemsen. Você acha que os resultados condizem com o planejamento? O que foi feito de certo e errado desde a ruptura com a Unimed nesse sentido?

Tendo o patrocínio da UNIMED como parâmetro balizador, eu, por óbvio motivo, me sinto impedido de opinar.

13 – Quais mecanismos podem ser usados para evitar uma espanholização do futebol? No próximo ano, Corinthians e Fla, por exemplo, receberão três vezes mais do que o Flu. Como pretende gerar mais receitas para o clube?

Marketing, meu caro. E as receitas potenciais de estádios, da marca, dos direitos de imagem etc. O Fluminense tem peso e história e, agora, estrutura para conseguir melhores resultados para a coluna das receitas. E nunca teremos espanholização por aqui, só porque as cotas de TV são maiores pra uns ou pra outros. Os times competitivos resolvem isso. E, cá entre nós, não é de hoje que as receitas do Flamengo e do Corinthians são maiores que as nossas e nunca tivemos dificuldades para enfrentá-los. Temos, quando o Fluminense, no futebol, é mal gerido ou gerenciado com crises.