Romário está na torcida pelo Fluminense (Foto: Agência Senado)

Durante a pandemia do novo coronavírus e a crise que ela traz junto, muito se discute sobre qual deve ser a postura da CBF na ajuda aos clubes para atravessar esse período difícil. Hoje senador, Romário (Podemos) opina a respeito do papel da entidade. Na visão do ex-atacante, não adianta a confederação apenas dar dinheiro aos afiliados, mas tem de cobrar uma correta utilização.

– A solução não está apenas em dar recursos, mas fomentar e desenvolver novos parâmetros de gestão para os clubes – falou.

 
 
 

Em entrevista por e-mail ao jornal Lance na sua plataforma online, o Baixinho abordou diversos assuntos e cobrou uma gestão mais profissional dos clubes. Veja a íntegra da conversa do senador com o veículo:

Quais são os caminhos para os clubes brasileiros voltarem a se estruturar diante dos tempos difíceis da pandemia do novo coronavírus?

– A pandemia afeta a todos, sem exceção, mas trará mais problemas para aqueles que já estavam com suas contas desestruturadas. Ficará mais evidente a necessidade de uma reformulação na gestão de vários desses clubes e uma definitiva profissionalização. Não dá mais para orçamentos de R$ 300 ou 400 milhões serem geridos por amadores, que nem dedicação exclusiva dão ao clube. Fica cada vez mais importante também os clubes se unirem em torno de seus interesses e do futebol brasileiro como um todo, e parar de cada um agir de maneira egoísta. Ao contrário do campo, fora dele, não basta ter apenas um vencedor. O sucesso é conjunto.

O senhor destacou a postura recente da CBF ao suspender taxas de registro e transferência de jogadores por tempo indeterminado para clubes de menor investimento. Quais outros caminhos a entidade pode seguir para dar um amparo maior a estes clubes?

– A CBF tem um importante papel nesse processo de retomada. Como gestora máxima da modalidade, tem estrutura e caixa para ajudar o sistema do futebol nesse momento de grave crise, como vem fazendo. O presidente (Rogério) Caboclo tem se mostrado sensível a isso. Mas não basta dar dinheiro. Tem de cobrar sua correta aplicação, senão vai ser aquela história da torneira e do ralo. Soubemos nessa semana que o time do Audax, que faz parte da série A1 do Campeonato Brasileiro feminino, recebeu os R$ 120 mil de ajuda e não pagou suas atletas. Isso é um absurdo!

Alguns clubes das Séries A e B também já apresentavam problemas financeiros antes da pandemia. Acredita que devam receber suporte financeiro da CBF de que maneira? Crê que as agremiações possam se reerguer e sanar suas dívidas futuramente?

– Os clubes precisam, definitivamente, se erguer e se estabelecer com suas próprias pernas. É claro que, num momento de grave crise como o que estamos vivendo, alguma ações de ajuda financeira são necessárias, sobretudo para os pequenos. Já me manifestei sobre isso, inclusive. É como o paciente que vai para o hospital e precisa de uma injeção, para combater uma doença. Depois, volta pra casa com a recomendação médica de mudar alguns hábitos de vida, ou voltará a ficar doente. Os clubes ( não todos, mas uma boa parte deles) são estes pacientes que continuam bebendo muito, fumando, sem fazer exercício físico e que, quando a doença aperta, vão logo pedir um socorro. A CBF, nesse sentido, tem de liderar um processo de mudança nesse ambiente de gestão coletiva e individual dos clubes.

Além de uma presença mais incisiva da CBF, crê que seja o momento do Estado intervir de alguma forma para “socorrer” o futebol brasileiro?

– Em termos de recursos, não. O dinheiro público tem outras prioridades, como saúde, educação, segurança pública. Os inúmeros refinanciamentos das dívidas fiscais demonstraram que não são suficientes, e acabam “viciando” os clubes. Mas acho, sim, que podemos contribuir com alguns aperfeiçoamentos na legislação para que criemos um ambiente estruturado e saneador para o futebol, que hoje ainda vive de alguns poucos clubes com uma gestão competente e transparente, mas cuja maioria ainda não se modernizou e se profissionalizou.

O que acha dos projetos do clube-empresa e da Sociedade Anônima do Futebol (SAF)?

– Acho extremamente importante debatermos e discutirmos esse tema no Parlamento, junto com toda a sociedade e os atores do futebol envolvidos. Como já mencionei, precisamos criar um ambiente favorável de gestão dentro do futebol. Não creio que tenha fórmula mágica e universal. Temos estudado modelos de diversos países para buscar o nosso, de acordo com as nossas características. Tanto o projeto que veio da Câmara, do deputado Pedro Paulo, quanto o do senador Rodrigo Pacheco tem seus méritos. Temos de buscar um entendimento lá adiante sobre o modelo que precisamos, sem imposições ou novo derrame de dinheiro público. A prioridade do país agora é combater a pandemia. Mas, certamente, essa questão entrará na agenda do Parlamento mais adiante.

O senhor fez um projeto de lei para que a Seleção Brasileira se tornasse um patrimônio cultural. Como fazer com que o futebol nacional volte a ser mais atrativo, seja em jogos da Seleção ou em competições nacionais?

– Com mais transparência e gestão profissional, seja nas entidades de prática quanto nas de comando e administração. Isso trará naturalmente mais organização e recursos para o futebol brasileiro, e conseguiremos manter a maior parte de nossos craques jogando aqui, criando raízes com a torcida e desenvolvendo a nossa técnica. Antigamente, bastavam o improviso e o talento natural de nossos jogadores para encantarmos o mundo. Talentos, ainda temos. Mas falta gestão para mantê-los aqui e desenvolvê-los com o nosso estilo de jogo, dentro de um futebol mais moderno e ágil. A Seleção Brasileira será consequência disso.

Quando jogador, Romário foi campeão da Copa do Mundo de 1994 e teve passagens por diversos clubes. Entre eles, o Fluminense. No Tricolor, atuou entre 2002 e 2004. Fez 77 jogos e 48 gols.