Gum teve passagem para lá de vitoriosa pelo Fluminense (Foto: Photocamera)

Jogador com uma história para lá de vencedora no Fluminense, Gum concedeu entrevista exclusiva ao NETFLU. O zagueiro defendeu o clube de 2009 a 2018, disputou 414 partidas pelo Tricolor e fez 29 gols. Além disso, foi bicampeão brasileiro (2010 e 2012), campeão carioca (2012) e campeão da Primeira Liga (2016). No bate-papo, falou sobre o sentimento que ainda nutre pelo clube, dívida a receber, tristeza ao sair e muito mais.

Confira a íntegra da entrevista de Gum ao portal número 1 da torcida tricolor:


 
 
 

NETFLU: Bicampeão brasileiro pelo Fluminense, sendo peça importante em ambos os títulos, você ainda mantém contato com alguém do Tricolor?

Gum: Eu converso com alguns amigos de lá dentro do possível. Continuo sendo tricolor, torço muito pelo clube, pelo presidente Mário Bittencourt, que tenta colocar as coisas em dia. Vejo que tm se esforçado para isso acontecer e espero que tenham êxito.

NF: A não renovação do seu contrato te surpreendeu ou te deixou alguma mágoa do Fluminense?

– Eu não esperava sair. O clube, naquele momento, fez uma proposta de um ano de contrato, eu pedi dois anos. O Abad (presidente na ocasião) falou que só tinha um ano para me oferecer, imaginei que fosse renovar, mas não entramos num acordo, não teve uma última proposta. O tempo passou e não tinha como permanecer porque contrataram outro zagueiro. Eu entendi que Deus estava me tirando do Fluminense, porque eu queria continuar, mas não teve a renovação. Foi dessa maneira, apesar de não esperar. Aconteceu.

NF: O que tem achado do sistema defensivo do Fluminense?

– Todos têm qualidade e por isso têm revezado. Está em aberto ainda e quem mantiver uma sequência boa, vai acabar ganhando a titularidade. Gosto muito do Nino, por exemplo, que participou da seleção olímpica.

NF: O que mudou do Digão que você conheceu em no início da carreira dele para o Digão de agora, titular e capitão do Fluminense?

– Hoje ele tem uma experiência, maturidade maior do que quando estreou. Rodou alguns clubes, ganhou experiência e tem essa bagagem de poder ajudar o clube. A pressão é natural e hoje ele tem essa capacidade de conseguir administrar bem a pressão. A mudança maior do Digão foi o que ele conseguiu nesses anos. Ele está preparado mentalmente para encarar o desafio porque a defesa é sempre mais cobrada. Pela dedicação que ele tem pelo clube, isso pesa.

NF: Fred e Fluminense: Esse casamento será reatado?

– Eu conversei com o Fred há um tempo, mas ele estava num momento muito difícil por conta dessa saída do Cruzeiro. Ele nunca saiu do Fluminense por vontade dele. Inclusive a gente estava em Chapecó na época e, como amigo próximo dele, me disse que iria sair porque os caras queriam vendê-lo. Depois mandaram notícias como se ele quisesse sair, mas quem quis vender foi quem estava no clube. Ele sempre teve vontade de voltar e hoje está tendo a oportunidade. Vai ser bom para os dois, porque o Fred volta pra onde ele nunca deveria ter saído e o Flu recebe um ídolo que é amado pela torcida.

NF: Você ainda espera retornar algum dia para o Fluminense, talvez para um jogo de despedida…?

– Eu posso dizer pra você que, quando eu saí do Fluminense chorei três dias porque sou tricolor. A minha esposa sabe disso, meus amigos… não tem como voltar no tempo, infelizmente. Eu desejo no meu coração voltar ao Flu, encerrar a carreira lá. Mas tem algo que as pessoas não sabem. Tem coisas que o Fluminense ainda não me pagou. Infelizmente é uma situação que já faz mais de um ano e seguem sem pagar. São direitos trabalhistas e, como tricolor, falei para o Abad que não queria entrar contra o clube na Justiça e dar mais uma notícia ruim. E eu vou ser obrigado a fazer isso, porque já passou muito tempo e não me pagaram. E isso pode afetar uma volta futura minha ao Fluminense. A vontade de se aposentar no Fluminense, nem que fosse pra encerrar num único jogo, eu tenho muito. Não me via jogando com outra camisa. Eu tive até problemas emocionais quando fui enfrentar o Fluminense, porque era algo que não imaginava que pudesse acontecer.

NF: Não tentou um acordo com a gestão Mário Bittencourt para receber o que falta?

– Não cheguei a conversar com o Mário, porque fiquei esperando até hoje. Ele, como presidente, deve saber, mas não tenho certeza. O Mário é um amigo da época do Fluminense, quando trabalhava do clube. É muito tricolor, tem uma história bonita. Até por isso não liguei para falar com ele sobre o tema, porque não queria misturar as coisas, o profissional e o pessoal.

NF: Qual é a sua perspectiva acerca desta paralisação por conta do coronavírus? Fala-se sobre redução salarial dos jogadores, além dessa antecipação das férias. O que pensa sobre?

– Tem que ter muita calma. É uma situação única, uma pandemia mundial. Tem que ter calma para ver a melhor forma para conduzir essa situação. No momento, essa antecipação das férias foi a melhor alternativa. Jogar o futebol sem torcida não ofereceria o mesmo espetáculo. Essa foi a melhor decisão mesmo. A massa, a torcida não iria poder acompanhar os jogos para não ficar aglomerada. E quanto a salário, tem que ver quando as competições vão voltar, ver se o clube vai ser afetado financeiramente, na arrecadação. Se acontecer esse déficit, concordo.

NF: Gum e Leandro Euzébio formaram a melhor dupla de zaga da história do Fluminense?

– Não sei te dizer se foi a melhor, mas sei que é a mais vencedora. Teria de pegar a história do Fluminense para ver os dados. Não é porque sou eu, mas sei que estamos marcados com títulos brasileiros, carioca… isso ninguém tira, independentemente se gostou ou não da maneira como a gente jogou. Eu não me apego muito a isso, porque é opinião de cada um. Sou grato porque conquistamos as coisas com muito trabalhos e acho que não teve quem tenha vencido mais do que nós.

NF: A saída do Leandro Euzébio deveria ter sido conduzida de outra forma, já que o atleta ficou treinando separado, descartado pela diretoria?

– Sim. Saiu de uma maneira que não foi legal, assim como eu saí do Flu. O próprio Cavalieri, Fred, Jean… deveriam ter tido um cuidado maior porque ajudamos a construir uma história bacana do clube.

NF: Te incomodava o canto “Gum Guerreiro dá porrada no Escudero” entoado pela torcida? Você lembra do contexto desta música?

– Eu era muito jovem naquela época. Vivi um 2009 muito intenso, a gente ganhava na raça, na briga. Em muitos jogos a gente sofria com torcida tacando pedra na gente em campo e arbitragem contribuindo com jogo truculento. Naquela partida o contra o Argentino Juniors, quando a torcida do Flu adotou essa música, eu nem estava participando de confusão. Mas os jogadores do time argentino não aceitaram a derrota, vieram para nos agredir, inclusive um segurança dos caras veio e acabei tendo que me defender. Imagino que essa música é uma homenagem da torcida por eu ter defendido o Conca, meus companheiros. Foi um instinto de defesa. Tive que me defender, apesar de ser contra a violência. Foi um jogo importante, porque nos classificamos, ficou gravado na memória de todos.

NF: O que pode comentar sobre a polêmica saída do Emerson Sheik, cantou bonde do Mengão sem freio no ônibus? Ele foi o único?

– Eu nunca tive problema com o Sheik sobre trabalho e tudo. Tem duas visões sobre essa situação. Não foram todos os jogadores que cantaram, estavam brincando. E isso aconteceu, mas não foi só ele. Cantaram esse negócio do Flamengo e o que acontece: o presidente tomou um decisão, que ele fez como presidente e torcedor, mandando o Sheik embora. Se ele errou ou não, ele tomou uma atitude. Se não tivesse tomado a atitude, outros iriam criticar. Poderia ter dado uma multa e o Sheik ficado no Fluminense nos ajudado a conquistar outros títulos, como fez no Corinthians.

NF: Existia briga entre Emerson Sheik e Fred?

– Nunca presenciei isso. Tinha um convívio normal entre eles. Se respeitavam e eu nunca fiquei sabendo de algo que viesse a atrapalhar. Dentro de campo, que é mais o importante, os dois resolviam. Só fiquei sabendo de alguma coisa pela imprensa, mas nunca confirmei isso.

NF: O que você pode falar sobre a arrancada apoteótica de 2009, quando o Fluminense tinha 98% de chances de ser rebaixado e impressionou o Brasil revertendo a situação?

– Foi um momento tão incrível para nós que a torcida abraçou o time. Lembro que a gente estava treinando na Ilha do Governador e disseram que se a gente não caísse, no ano que seguinte iriam trazer o Deco. Eu fiquei com aquilo na cabeça para a gente se reforçar. Além da motivação junto com a torcida… a fome aumentou cada vez mais. Se não fosse aquela arrancada, muitos jogadores sairiam, o patrocínio diminuiria, teria que se restruturar. Foi fundamental para reescrever a história do Fluminense nos anos seguintes. Foi dali que nasceu o Time de Guerreiros. Tenho muito orgulho de ter participado disto.

NF: Final da Sul-Americana: ainda sente muito a perda do título?

– Fiquei muito triste porque a gente queria muito aquele título. O bom é que fomos campeões em 2010 do Brasileiro. Perdemos o título no primeiro jogo lá no Equador. O que eu lembro é que a gente foi corajoso e perdemos o título por isso. A gente tentou partir pra cima deles lá no Equador e não deu certo na altitude. A gente fez 1 a 0 lá e eles viraram. Depois se a gente tivesse tentado cozinhar o jogo e tentado perder de pouco, a gente com certeza teria revertido em casa. Faltou maturidade.

NF: Alegria pelos títulos brasileiros: algum marcou mais do que o outro?

– Os dois títulos têm sabor diferente e pesos diferentes. Mas são especiais da mesma forma. O 2010 foi logo depois daquela arrancada incrível em 2009. E o time não vencia o Brasileiro há 26 anos. Isso foi muito importante. É uma marca na carreira a gente ter ganhado o Brasileiro ainda mais sendo importante. Em 2012 foi também incrível porque a gente fica marcado mais ainda por ter conquistado de novo algo importante para o clube. Dou a mesma importância.

NF: Mensagem para a torcida do Fluminense:

– Meu coração é tricolor, continua sendo. Amo muito esse clube. Agradeço por ter participado da história do Fluminense e agradeço o carinho da torcida. Eu retribuí com muita gana, muita vontade de vencer. Entendo todas as críticas dos torcedores, porque quando se perde um jogo, a gente extrapola. Sigo torcendo de longe, acompanho todos. Fiquei muito bravo com derrota no clássico contra o Flamengo, no Carioca deste ano. Sei o quanto dói quando o Fluminense perde.