Do acidente que vitimou as duas filhas de Leo Percovich até a primeira partida do sub-20 do Fluminense, foram 43 dias. Neste período, o treinador do Fluminense já percorreu um caminho longo. Ele passou por uma terapia de regressão para tentar se lembrar do momento fatídico, um vazio em sua mente. Não funcionou. Também voltou ao local do acidente, uma ponte na rodovia BR-040, em Santos Dumont, Zona da Mata Mineira. Lá, agradeceu aos moradores que socorreram a ele e sua família, e notou que não há mureta de proteção no ponto onde o carro caiu.

– Triste saber que o governo, talvez por economia, não se preocupa com a vida de pessoas tão caras – disse.

 
 
 

No discurso do técnico, é possível perceber o sentimento de culpa. Percovich contou que Juliana e os filhos tinham passagens aéreas compradas para Minas Gerais, onde passariam o Natal com os pais dela. Mas ele fez questão de levá-los de carro. O conforto só foi encontrado no kardecismo:

– Começamos a entender que existe uma conexão, um porquê e um quando. A gente se refugia nisso porque dá paz. Não acaba com a dor. Mas a gente aprende a não viver com sofrimento, que é diferente. A dor vai continuar pelo resto da vida. Mas você a coloca de um lado, do outro, ajeita. O sofrimento te mata – resumiu.

Também encontrou forças em Abel Braga. O técnico dos profissionais perdeu o filho João Pedro  em julho de 2017. Ao tomar conhecimento da tragédia do uruguaio, preocupou-se em entrar em contato com ele.

Foram várias tentativas sem sucesso, já que Percovich perdeu seus dois celulares no acidente. Quando, enfim, o uruguaio substituiu o aparelho, a ligação foi completada. Ao ouvir a voz do colega de profissão do outro lado da linha, o técnico do sub-20 caiu em lágrimas.

– Perguntei como fazia para continuar. Ele falou: “Pega sua esposa, seus amigos e sua família e se dedica ao trabalho para você se manter forte. Porque a dor não vai passar” — relatou Percovich, comovido com o gesto de Abel: — A gente tinha uma aliança de dor. Eu tinha entendido a dimensão do que ele passou. E ele estava entendendo onde que eu estava metido.

Da mesma forma que Abel, Percovich tem encontrado no trabalho a força para seguir em frente. E quer que isso motive os jogadores.

– Falei que, se realmente querem me ajudar a sarar, a melhor forma não é mandando mensagens ou dando tapinha nas costas. Mas demonstrando entrega todos os dias. E acho que eles entenderam – explicou ele.